Por Lucas Neves, de São Paulo
Esqueça a imagem sóbria, a cordialidade pudica que emoldura os retratos dos candidatos em panfletos e santinhos de campanha.
Um impresso distribuído nas entradas de algumas estações de metrô de São Paulo (e que também anda circulando em campi universitários) da capital traz cartuns dos seis principais nomes da disputa pelo governo municipal nus. A cobrir suas partes pudendas, só um ou outro adereço cênico ligado à biografia de cada um. Ah, sim, e austeras meias pretas nos pés.
É assim que, por exemplo, Paulinho da Força (PDT) se protege com um boné da central sindical que o projetou, a cicloativista Soninha Francine (PPS) posa com uma roda de bicicleta e o professor e ex-secretário da Educação Gabriel Chalita (PMDB) surge atrás de uma pilha de livros.
O “peep-show” eleitoral é ideia do roteirista de material pedagógico Leonardo Bastos, 29, que reuniu os desenhos no blog Nu de Meia e em mil panfletos que circulam pela cidade. Segundo descreve no blog, a ideia é antiga, mas nunca tinha tempo para colocá-la em prática. A edição com os políticos, por enquanto, é a única no blog.
Ele diz que o mote da “nudez de meia” veio da vontade de aliar “a sugestão de honestidade, entrega” da falta de roupas à “hipocrisia, falsidade” que a intrusão de uma peça de vestuário acrescenta a esse quadro. “É uma entrega, mas nem tanto. E também simboliza o ‘almofadinha’ que dorme de meia, a elite”, explica Bastos.
Além de Paulinho, Soninha e Chalita, ele pôs no papel um Celso Russomanno (PRB) que leva no colo a bandeira da cidade (“porque é um candidato tradicionalista, bairrista, de direita”) e a dupla Fernando Haddad (PT) e José Serra (PSDB) envolta em motivos florais, quase a sugerir um mar de rosas.
“É para mostrar que não existe rixa real entre eles, não há tanta diferença entre as propostas”, justifica. A única diferença é que o petista, 49, faz pose de galã, enquanto o tucano, 70, parece envelhecido, uma figura alquebrada.
“ESSE NÃO FUI EU QUE FIZ”
Há também “participações especiais” do nanico Levy Fidélix (PRTB), com menção ao indefectível aerotrem, e de Paulo Maluf (PP), exibindo o “figurino” despudorado “comme il faut”. A centímetros de Haddad (a quem apoia), o ex-prefeito acrescenta uma negativa a seu velho bordão e se esquiva: “Esse não fui eu que fiz”.
Em torno dos candidatos, há símbolos que entregam com diferentes graus de nitidez o que o desenhista pensa deles. Russomanno, por exemplo, tem a companhia de ratos. Atrás de Paulinho, há uma maleta que pode levar as ferramentas de um operário ou instrumentos de trabalho menos nobres.
Já Soninha pisa num canteiro em que chama a atenção uma planta de cannabis sativa –a candidata deu entrevista há alguns anos dizendo fumar maconha. E Bastos insere uma cruz na “biblioteca” de Chalita. O peemedebista é ligado à ala da renovação carismática da Igreja Católica.
Apesar dos comentários subliminares, o cartunista diz não ter candidato nessa eleição. “Normalmente, voto nulo. Com certeza não voto no Serra, nem no Russomanno, nem na Soninha. E provavelmente tampouco no Haddad”, despista.